Exército Brasileiro (EB) busca se atualizar para atender às demandas decorrentes dos novos tempos provenientes da Era do Conhecimento; parceria com o CISB abriu portas para que militares conhecessem de perto o ambiente de inovação sueco, um dos mais respeitados internacionalmente.
Crescente demanda global por alimentos e recursos hídricos, energéticos e minerais, surgimento de novas tecnologias, adensamento das populações urbanas e outras mudanças são marcas evidentes no mundo hoje. Todos esses aspectos impactam diretamente a maneira como governos e entidades civis atuam. Com o Exército não é diferente. As transformações sentidas em todo o planeta atualmente demandam uma nova maneira de desenhar a estratégia de defesa de uma nação, tornando-a alinhada às novas exigências trazidas pela modernidade.
No Brasil, o início do processo de mudança ocorreu ainda em 2011, com a transformação do Sistema de Ciência e Tecnologia do Exército (SCTEx). Naquela ocasião, a sua força motriz deixou de se limitar às exigências atuais da entidade e passou a focar principalmente nas necessidades futuras da Força. “Precisávamos inovar, criando e disponibilizando soluções que propiciassem novas capacidades terrestres e operacionais”, diz o Coronel Tales Villela, chefe da Assessoria Estratégica do Departamento de Ciência e Tecnologia (DCT). Logo ficou claro que investimentos em uma equipe altamente qualificada seriam determinantes para que o processo de inovação fosse bem-sucedido. É dentro desse contexto que surge a parceria com o CISB e a relação com a Suécia.
O país escandinavo entrou definitivamente no radar do DCT ao figurar sempre em posição de destaque segundo o Global Innovation Index (GII). Com a Suécia ganhando pontos por seu estímulo à inovação, restava encontrar alguma entidade que realizasse a ponte entre as duas partes, o que tornou o CISB o parceiro ideal para as novas ambições do Exército. Para formalizar essa parceria, as duas instituições assinaram um Memorando de Entendimento em agosto de 2013.
Desde então, três turmas da Força foram enviadas à Suécia para acompanhar de perto o ambiente de inovação tão bem-sucedido. Selecionados, principalmente para compor o efetivo da AGITEC (Agência de Gestão e Inovação Tecnológica), organização militar recentemente criada pelo EB, os estudantes participaram do Curso Executivo em Gestão da Inovação, ministrado na Universidade de Linköping, onde também tiveram contato com representantes da Saab e outras indústrias. Parte das aulas e encontros ocorreu no IME (Instituto Militar de Engenharia), no Rio de Janeiro. O curso contou com aulas teóricas, instruções, aplicação real do conteúdo e visitas de campo a Institutos de Ciência e Tecnologia e plantas industriais. “O que mais nos interessou foi o modelo de hélice tríplice, em que academia, indústria e governo se unem em prol da inovação”, diz o Coronel.
“Como pode um país tão pequeno realizar coisas tão fantásticas?”
A indagação é do Major Engenheiro Militar Aderson Campos Passos. Servindo no IME, o oficial passou um mês na Suécia em 2015, onde se impressionou com o modelo de inovação local. “Chamou a atenção o incentivo ao empreendedorismo e à produção de conhecimento com foco na inovação industrial – que é feito no Brasil, mas com viés bem diferente”, conta.
A experiência gerou insights para um processo que vem provocando uma enorme transformação no IME, que envolve ações na melhoria da infraestrutura, planejamento de pessoas, aperfeiçoamento do ensino, desenvolvimento da cultura empreendedora e da aproximação com a indústria.
Já em 2015, a entidade abriu diálogo com indústrias para tentar desenvolver projetos de interesse comum. “A ideia é começar pequeno. Naquele ano, realizamos quatro projetos na área de defesa com algumas indústrias. Em 2016, fizemos mais uma jornada com o mesmo formato, porém com seis empresas participantes”, diz o Major Aderson, lembrando que mais ações do tipo devem ocorrer neste ano.
Outra iniciativa de destaque foi a implantação de um conjunto de boas práticas de ensino de Engenharia com a adoção da metodologia CDIO (Conceiving — Designing — Implementing — Operating), criada num esforço conjunto de três universidades suecas: Royal Institute of Technology – KTH, Chalmers University of Technology e Linköping University e o MIT nos EUA. A novidade, inclusive, tem tudo a ver com os objetivos da Força, uma vez que parte do pressuposto de que o ensino de Engenharia deva se enquadrar aos novos tempos, sendo mais pragmático, sistêmico e não excessivamente limitado a questões técnicas.
Nesse contexto, também é de grande importância a implementação, em 2016, de um curso de Empreendedorismo em parceria com a FGV-RJ, antes destinado apenas para alunos de Administração. “Montamos o curso em conjunto para que alunos e professores das duas instituições interagissem em sala de aula”, diz. Em 2017, o curso voltará a acontecer, porém como uma pós-graduação do próprio IME. “Também estamos desenvolvendo a cultura empreendedora, com foco em start-ups de tecnologia de alto crescimento. Tudo isso vimos na Suécia”, afirma.
Impacto
A Capitã Lígia Lopes Fernandes, da Seção de Informação Tecnológica da AGITEC, passou um mês no país escandinavo e conta que foi impactada pelos cases de inovação aberta apresentados ao longo do curso. “O modelo era novo para mim e foi muito interessante conhecer como foram conduzidos alguns projetos de pesquisa e desenvolvimento dessa forma e, em especial, o modelo de arena de inovação aberta (Open Innovation Arena)”, diz. “O curso me proporcionou a base para entender o universo em que trabalho desde então”, afirma.
O aspecto cultural também saltou aos olhos dos participantes. “Percebi que a cultura sueca é muito participativa: a coletividade prevalece sobre o indivíduo”, relata o Tenente-Coronel Leonardo Oliveira de Araújo, chefe da AGITEC. “Nos seminários e nas aulas, lembro de apenas 2 pessoas que falaram em primeira pessoa. De modo geral, eles sempre usavam o ‘nós’ para se referir às suas ações”, diz.
O oficial diz que essa característica é fundamental para o sucesso do modelo de hélice tríplice. “No Brasil, gostamos muito de ressaltar o nosso trabalho e esquecemos de enaltecer a coletividade. O primeiro passo para empreender um processo de inovação é vencer essa barreira”, afirma. O Coronel Tales Villela endossa: “o ambiente de inovação sueco é baseado na confiança mútua. Nele está a chave de todo o sucesso”.