Professor do ITA está montando laboratório para estudar o comportamento humano na pilotagem de aviões. Objetivo é identificar fatores de risco que servirão de base para desenvolvimento de cabines projetadas de maneira a colaborar na redução de falhas dos pilotos e, consequentemente, na redução no risco de acidentes.
Os números impressionam. Segundo estudo de 1998 da Flight Safety Foundation, uma organização internacional com foco na segurança aérea, nada menos que 80% dos acidentes com aeronaves ocorrem devido a falhas humanas. Por sua vez, estas derivam de uma somatória de fatores, que vão desde a fadiga mental dos pilotos à disposição dos instrumentos do painel de controle, que pode dificultar determinadas leituras críticas para a tomada de decisões.
Foi com esses dados em mente que o professor Luís Gonzaga Trabasso, do ITA (Instituto Tecnológico de Aeronáutica), começou a conceber a criação de um laboratório que estudasse fatores de risco na pilotagem de aviões. O ponto de partida foi a ideia de adaptar um simulador de voo desenvolvido conjuntamente pelo ITA e pela Embraer (Empresa Brasileira de Aeronáutica) com financiamento FAPESP e estabelecido dentro do próprio ITA para realizar os primeiros testes.
O próximo passo foi aprofundar os estudos. A Suécia surgiu como um destino natural, devido à proximidade entre a Saab AB e o ITA. Além disso, Trabasso conta que ao longo dos anos participou de vários workshops organizados pelo CISB que reuniram Brasileiros e Suecos. “Ali estabeleci os primeiros contatos com o pessoal da Saab e, principalmente, da Linköping University”, conta. As instituições acabaram abraçando a causa e o professor realizou seu projeto de pós-doutorado por meio de uma bolsa oriunda de uma Chamada de Projetos CNPq-CISB-Saab dentro do âmbito do Programa Ciência sem Fronteiras entre os meses de fevereiro de 2016 e 2017.
Na Linköping University, o ambiente não poderia ser mais propício. Alocado na área de Sistemas Centrado na Pessoa (Human Centered Systems), o professor teve a oportunidade de conhecer o grupo de pesquisas em cognição e interação, áreas ainda desconhecidas por ele. Os estudos lhe permitiram aprender a analisar fatores dificilmente mensuráveis, como a medição da carga de trabalho mental de uma pessoa.
“Foi um aprendizado novo”, afirma. “Trouxe de lá um projeto de laboratório centrado em equipamentos necessários para o setor de fatores humanos e também experimentos necessários para fazer as medições”, conta o professor. O objetivo de suas pesquisas é levantar dados que possibilitem a criação de cabines mais seguras, com eventuais mudanças nos sistemas de aviso, na disposição dos painéis de navegação e em outros itens que afetam o desempenho do piloto.
O aprendizado não se limitou à área técnica. Na Suécia, o professor teve uma experiência cultural muito rica. Entre as novidades, ele descobriu o chamado “fika”, termo Sueco que significa, literalmente, ‘tomar um café’, mas que é usado em alusão a reuniões informais periódicas – o equivalente ao nosso tradicional ‘cafezinho’. Diferentemente do que ocorre por aqui, porém, os encontros na Linköping University ocorriam regularmente todas as semanas – e com hora marcada.
Nesses bate-papos, os trabalhos em andamento em diferentes áreas da universidade eram debatidos livremente, abordando aspectos positivos e negativos de cada pesquisa. “Lá eles são mais tolerantes ao fracasso e compartilham as más experiências como um meio de aprendizado. A naturalidade é a mesma para dizer que um artigo foi aceito ou rejeitado por uma revista”, diz o professor. Trabasso gostou tanto do que viu que deseja institucionalizar a prática no ITA.
Agora o professor busca financiamento para o Laboratório de Fatores Humanos. Trata-se de um trabalho único no Brasil, por isso as expectativas são enormes. Uma reunião com o pessoal do BNDES está prevista para abril. Trabasso irá solicitar recursos ainda junto à Finep (Financiadora de Estudos e Projetos) e à Fapesp (Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo), tudo para aumentar as chances de viabilizar a iniciativa.